terça-feira, 7 de outubro de 2003

Let's talk about sex baby, Let's talk about you and me ou Se este post fosse um trabalho académico



Continuando a reflectir sobre alguns dos temas essenciais da minha busca pela límpida medida - os outros, os paradoxos, a diversidade, a transcendência - debruço-me agora sobre os profundos efeitos que o sexo pode ter.



Importa ler George Bataille n'O Erotismo, pois com ele iremos discutir:



"Os outros, na sexualidade, não deixam de oferecer uma possibilidade de continuidade, os outros não deixam de ameaçar, de introduzir um rasgão na túnica inconsútil da descontinuidade individual [...] De ambos os lados trata-se de um movimento que obriga a sair para fora de si (para fora da descontinuidade individual) [...] O par animal, no momento da conjugação, não é formado por dois seres descontínuos que se aproximam, que se unem por uma corrente de continuidade momentânea: não se pode, em rigor, falar de reunião, mas sim de dois indivíduos dominados pela violência, associados pelos reflexos ordenados da conexão sexual, que partilham um estado de crise em que um e outro estão fora de si"



Dois são os temas fundamentais aqui em presença.

O Outro e o efeito transcendental do sexo. Melhor, do erotismo.

O primeiro coloca-nos, de novo, e sempre, sobre o signo de Diónisos. Ele é, na bela formulação de Jean Delumeau, o Deus do Outro.



O Outro é, afinal, a nossa continuidade ou dependência, consoante sejamos, solitários ou temerários, respectivamente.

Curiosamente, os pápeis parecem inverter-se no acto sexual. O solitário vê no erotismo a sua última possibilidade de redenção e de superação. O momento em que irá deixar o conhecimento de si para atingir um outro estado de intimidade em que não existe apenas o Eu. Deseja o sexo como uma porta para a transcendência que só aquele Outro lhe pode proporcionar. O sexo é, nestes casos, verdadeiramente, uma perdição e ao mesmo tempo uma reunião. Não estamos muito longe do ser andrógino de Platão e, assim, das almas gémeas. Na verdade para os seres solitários de que venho falando só existem dois tipos de sexo: o simples acto físico, em que se mantém distantes (o que tantas vezes melhora fisicamente o acto) e aquele em que o espírito intervém, para se diluir no Outro. Estou a falar de uma sensação de envolvência do sexo que o transfigura por completo, pois sentimos que estamos a abraçar, a mover muito mais do que os corpos mas algo que não vislumbramos embora o consigamos sentir. Neste sentido o solitário encara o sexo como uma categoria mística, o momento final em que, pelo Outro e por si, acede a outro plano da existência.. O temerário mercê do seu percurso, mantém-se, para usar a expressão de Bataille, descontínuo. Apesar pode atingir altos picos sexuais e de o desejar, ao temerário escapará sempre a fusão com o Outro. O acto sexual pode consumar um profundo conhecimento de si, mas claro está, só porque o temerário está ainda em busca de si e não ainda do Outro. O temerário, num certo sentido, busca outros e não o Outro, que teme. Encontrará vários, no seu percurso, pois compreende melhor a sua linguagem que os solitários. Mas faltar-lhe-á a compreensão de si mesmo para transformar algo dele no Outro ou, simplesmente, reconhecê-lo ou aceitá-lo. E o sexo, por mais intenso que seja não atingirá a alteridade, não repercutirá algo que não existe: a continuidade dos dois seres

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