quinta-feira, 20 de setembro de 2018

As antigas civilizações

Na idade em que os meus filhos começam a despertar para a consciência do mundo e a formular memórias que os poderão acompanhar pela vida inteira (5/6 anos) dei por mim a pensar na semelhança entre as importantes pessoas da minha vida que nunca conhecerão e as fantásticas civilizações perdidas que ocupam o meu imaginário. 

Desde miúdo que sou fascinado por todo o tipo de civilizações antigas, não apenas aquelas que conhecemos, bem ou mal, como a civilização babilónica ou assíria, azteca ou maia, védica ou viking, mas também civilizações que podem nunca ter sido, como a Atlântida, ou que simplesmente foram inventadas, como todas aquelas que encontramos recorrentemente na ficção. Daí que tenha tido a minha quota de livros e jogos sobre todas estas civilizações, alguns misturando todas, como é o caso da saga Assassin's Creed, que jogo apaixonadamente nos dias que correm. 

O que mais fascina nestas civilizações é o nível de sofisticação de vários aspectos do que é ser humano, em períodos tão longinquos, tão distantes da realidade que conhecemos hoje. Como se tivesse havido um recomeço do mundo e o que estivéssemos vivendo hoje fosse um outro tempo, completamente diferente, uma outra vida da histórias das civilizações.

O mesmo acontece com as pessoas que me foram morrendo ou que por qualquer razão saíram da minha vida. Eu trago-as comigo, sem esforço, mas elas não têm existência palpável no dia-a-dia, exceto, tal como as antigas civilizações, pelo surgimento, às vezes, de artefactos que as evocam ou de repositórios de objetos que as recordam. Por vezes, pego num livro e digo alto: este livro foi a Salette que me ofereceu. E o meu filho mais velho pergunta quem é a Salette. Antes ficava em choque quando estas coisas aconteciam. Mas depois comecei a pensar nas velhas civilizações. No modo como para alguém que as tenha conhecido ou vivido (como se existisse alguém assim) ou para alguém que as estude, muitas coisas que hoje nos parecem novas e revolucionárias já haviam sido propostas ou desenvolvidas por tais civilizações. De igual modo com a descoberta, pelos meus filhos, dessas pessoas importantes na minha vida, mas a que elas só poderão chegar por objetos e conversas comigo. A Salette morreu muitos anos antes de os meus filhos nascerem mas acompanhou-me durante toda a minha infância e adolescência. Foi um dos primeiros "crescidos" que se tornou meu amigo, com quem tinha uma relação autónoma, independente dos meus pais. Mas para além da Salette, há o Zé Manel ou mesmo o meu pai, de que os meus filhos mais novos nunca se lembrarão. Para eles, estas importantes pessoas da minha vida serão como as antigas civilizações. Com sorte conseguirei criar-lhes interesse e até fascínio pelas suas existências, mas serão sempre algo que existiu numa outra vida.

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