sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

O timing dos livros

(por acaso decorre as Correntes d'Escritas mas é mesmo coincidência)

Acabei de ler há uns dias o Catcher in the Rye. Gostei. Mas não me tocou (vocês sabem do que estou a falar). Não como me tocaram, por exemplo, Os três ensaios, de Montaigne, na tradução de Agostinho da Silva, quando os li, em plena adolescência.

Vai daí dei por mim a pensar no timing dos livros. Fundamental.

Creio que a maioria das pessoas que gosta de livros dirá que há um tempo para ler livros. Pelo menos, certos livros. Nunca pensei muito nisso. Mas tenho pensado cada vez mais. E, depois de ler Catcher in the Rye, aqui estou eu a escrever sobre isso, tentando arrumar ideias.

É que me parece que mais importante do que o timing são os nossos livros. Se ambos são factores da importante equação que devemos manter com a leitura e assim com a construção da nossa própria cultura e carácter, parece-me que importa mais não passarmos ao lado de livros que deveríamos ler, do que lê-los num momento ou noutro.

Não é tanto que esteja a negar a oportunidade da leitura de certos livros. Mas parece-me que se um livro é certo para nós, o timing da sua leitura apenas produzirá efeitos diferentes (e isso parece-me muito interessante de considerar) consoante a altura em que os leiamos; enquanto que a sua perda seria incalculável.

Vem isto a propósito de Catcher in the Rye, como disse. Romance-símbolo da angst adolescente, creio que seria essa a boa altura para lê-lo. Pelo menos, para lê-lo como um manual, uma confissão. Para lê-lo como identificação ou catarse. Lê-lo 15 ou 20 anos depois disso, para muitos, seria perdê-lo, na melhor das hipóteses, não retirar dele todo o seu sabor. Talvez tenha acontecido isso comigo, talvez fossem apenas as expectativas que estavam muito altas. A verdade é que não desgostei do livro e provocou até em mim uma reflexão interessante sobre o lugar da adolescência (não necessariamente a minha) na existência. Com um distanciamento (e as vantagens daí derivadas) que não teria sido possível então.

E houve até passagens que tenho a certeza terem sido melhor apreciadas agora:

"I wasn't too crazy about her, but I'd known her for years. I used to think she was quite intelligent, in my stupidity. The reason I did was because she knew quite a lot about the theater and plays and literature and all that stuff. If somebody knows quite a lot about those things, it takes you quite a while to find out whether they're really stupid or not."

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