sexta-feira, 27 de junho de 2008

Austin e as artes performativas

Ricardo Araújo Pereira estreia-se hoje em palco, no Teatro S. Luiz, em Lisboa, com a adaptação, feita por si próprio e por Pedro Mexia, de "Como fazer coisas com palavras", encenada por Dinarte Branco. Mas o que realmente me interessa é o autor de How to do things with words, o filósofo John Austin, que teve a amabilidade de nascer no mesmo dia que eu e a sorte de ter conhecido Wittgenstein.

A única coisa que se poderia dizer que virá de bom ao mundo desta peça será o facto de levar Austin às massas. Esta frase obviamente partiria da premissa que as massas acorrerão ao S. Luiz durante os 7 dias que estará em cena a peça. Tal não acontecerá. Não tanto porque as massas não queiram ir - há coisas de pasmar todos os dias e a popularidade de RAP não deve ser menosprezada - mas porque a limitação temporal e geográfica fará com que, como sempre acontece ao longo da história, haja uma selecção natural daqueles que podem aceder a um bem escasso, como esta peça.

Dito isto poder-se-ia corrigir a minha afirmação inicial e dizer que o que melhor poderá advir da encenação desta obra será levar Austin às elites. Aqui temos dúvidas. Creio ser possível colocar duas hipóteses. Não terão já consigo Austin as elites? Se sim, nada de novo. Se não, será possível que Austin vá até elas, indo elas até ao S. Luiz? Mais. Quererão elas Austin consigo? Não sei.

O que parece claro é que esta peça, antes de mais, serve os propósitos de dar um gozo dos diabos a quem já conhecendo ou estando interessado em conhecer Austin, pode desenvolver uma peça de teatro à custa dele. Nomeadamente, Ricardo Araújo Pereira e Pedro Mexia.

Digo isto porque tenho para mim um princípio dificilmente abalável: o prazer retirado da cultura rege-se por duas leis. Primo, é preciso perceber um bom bocado, e não apenas um bocadinho, do tema em causa para se começar a ter prazer. Ou seja, só ao fim de um bocado é que se começa a ter prazer. Secundum, o prazer conseguido pela cultura permite uma experiência de progressão exponencial. Ou seja, quanto mais tempo passa muito mais prazer se tem. Enfim, um pouco como a masturbação.

Partindo do princípio que a plateia dos 7 dias de peça não será composta por especialistas em Austin (que, aliás, em Portugal, não chegariam para encher um camarote em opening night) mas admitindo a presença de muitos conhecedores da obra de Austin, é bonito pensar que adaptação feita por Pedro Mexia e RAP poderá realmente trazer um prazer suplementar àqueles que nunca pensaram ver Austin em cima de um palco.

Nos outros casos, aqueles que irão por Mexia e Pereira, será interessante saber o que vão achar. Se alguém nessas condições, por um acaso, tropeçar neste post, por favor, não deixe de partilhar comigo a sua opinião. Comentário ou e-mail à disposição.

E com esta frase termino este post.

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