quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Exercício de Estilo - XXVII

O narrador sensível

No início do romance o narrador veio à boca do texto explicar que embora o autor tivesse decidido contar a história na primeira pessoa não era razão para confundir o protagonista consigo ou mesmo com o autor. Pedia, por isso, para terem atenção a esse tipo de tentação e separarem distintamente autor, narrador e personagem. O narrador acrescentou que percebia perfeitamente a particular dificuldadade da situação, estando em causa a utilização da primeira pessoa - o Eu - e, com uma voz sussurrada e tom cúmplice, acrescentou que essa técnica - o Eu - era quase sempre usada justamente porque os autores sabiam como era fácil levarem os leitores a pensar que o Eu se referia ao autor e/ou ao narrador. Assim, ele pedia, encarecidamente, que não fizessem essa confusão, que mantivessem em mente que mesmo que Eu mostre uma salutar incompreensão pela humanidade e considere que as pessoas são, por regra, mesquinhas e pouco exigentes consigo próprias, este Eu não se referia nem a si nem ao autor. Dito isto o narrador saiu de página e embrenhou-se no romance. Matou-se, um dia, quando percebeu que toda gente confundia o protagonista consigo. O autor ficou abalado, por uns dias, e depois inventou outro narrador.

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