sexta-feira, 14 de setembro de 2007

A botânica do corpo em verbo

Se Alice Oswald foi um dia pelo Dart, rio de Devon, ouvindo os seus murmúrios em forma de voz de gente, tornando-os poema torrente (Dart, faber&faber, 2002) pode dizer-se que a estreia de Joana Serrado cumpre uma estranha alegoria da terceira lei de Newton: eis aqui uma mesma força, uma mesma direcção, em quase sentido inverso. Se Oswald vai pelo Dart juntando todos os pedaços, arrulhos e memórias, arrumando-os num poema contínuo já Joana Serrado toma como máscara a botânica, como matéria o corpo, como fuga o amor e com tudo isto lapida um livro (Tratado de Botânica, quasi, 2006) em forma de arcano guia rosacruciano, ou não fosse, a rosa Plantae Magnoliophyta Magnoliopsida Rosales Rosaceae Rosoidea Rosa. E sem porquê. Mas com muita poesia. E se de rosas Joana nos escreve - estou um pouco ansiosa. Talvez procure magnólias ou rosas. Contentar-me-ei com rosmaninho- há além delas azedas, hortênsias, alfazema (a lembrar E se tu és baunilha e eu almíscar/Este quarto é sémen e alfazema, de Miguel Soares) sapatinhos, papoilas, donzelinhas. Também há flores polinizadas pelo vento, escreve-nos Joana Serrado no seu Tratado que hoje é apresentado publicamente. Não se trata de uma jovem promessa, de um bom começo, de uma revelação. Eis um Tratado que despontou completamente. Através de um sentido apurado das palavras, como uma poda serena, certa e terna. Eis tudo o que importa dizer.

Parafraseando as Especialistas

Amo-te com as pontas dos dedos

(pág. 39)




Poderia também dizer-te como crescem romãs
punicae granata da tua alma....


(pág. 54)

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