segunda-feira, 5 de janeiro de 2004

"O meu mundo é uno, os códigos são os mesmos, e construo as minhas pontes da mesma forma. Sendo assim, o meu Eu dá-se da mesma forma, e nesta perspectiva o par é mais viável. O outro longe magoa."



Figment




Da sagacidade do Mundo e da sua unicidade ou Eros e nada mais



Da capacidade, gosto de lhe chamar arte, de conseguirmos sintetizar em Mundo o mundo interior e exterior já aqui escrevi várias vezes.

Expliquei-me mal ou insuficientemente, o que é o mesmo. Também o meu Mundo é uno. Ou seria um dos tocados por uma esquizofrenia ou autismo de que falei anteriormente. Correctamente deveria afirmar que o meu Mundo é triplo. O mundo interior e exterior e o Mundo enquanto espaço de cruzamento dos dois. A sua síntese.

Mas daí a dizer que os códigos são os mesmo e que se constroem as pontes da mesma forma... Ou estamos perante um optimismo maravilhoso ou perante uma inocência desmesurada (agrada-me o pensamento de ambas). Se bem te entendo, com isso pretendes explicar que o teu Mundo, síntese de Interior e Exterior, é uno, assim, de linguagem e relações. Falarias com os outros uma língua semelhante à que utilizas nos teus diálogos interiores e as tuas relações seriam iguais às relações que manténs com as peças de ti. Figment, se te compreendo bem, então deixa-me dizer-te que não poderíamos estar mais de acordo. É que justamente é isso em que creio. Que devemos dar-nos ao Mundo, vindos de Nós, sem traduções ou concessões. Apresentarmo-nos como somos (eis onde habita o momento anterior da viagem interior - da Liberdade) e o resto que se dane! Eis, também onde de novo nos aproximamos. No entendimento das consequências desta vontade de afirmação da unicidade em Nós, do Mundo. Nosso. Isto porque estou contigo quando acreditas que é o Outro e não os outros que estão mais aptos a percebermo-nos como desejamos. Ou seja, sem cesuras nem quebras. Sem fracturas. O Outro, mediando Amor, viverá a síntese. Do Outro, teremos a experiência que temos também para nós: que somos apenas Mundo, sem noção da distinção do Mundo Interior e Exterior. Seremos unos para nós, o que já de si é missão complicada mas - Suprema Felicidade - seremos unos para um Outro de Nós. Eis o que busco há anos...



Mas com os outros tal não acontece. Essa utilização dos mesmo códigos, a construção das mesmas pontes esbarra na fria consciência de que a linguagem que utilizamos para nós nem sempre é compreendida pelos outros. Nem sempre as pontes se constroem da mesma forma como o fazemos interiormente. Eis a dura realidade. E a cisão, mesmo que a quisessemos ter negado (e não é o meu caso) torna-se evidente. Então temos três hipóteses. Vencem os outros, indistintos, Mundo Exterior e tornamo-nos uns Loucos da Normalidade (sim, Arno Gruen de novo) ou vence o Solitário de Nós, a exclusividade do Mundo Interior, que associo à tua ideia de dificuldades, dor, lado mau pois gera, invariavelmente, a reacção brutal do Mundo Exterior. Sem o qual muito dificilmente poderemos viver.

Mas há uma terceira via (felizmente não a do Giddens, um pouco mais Hegeliana ou Wittgensteiniana. Ou Atlante). Podemos tornar o Mundo um oásis destas duas prévias visões. Podemos em vez de buscar refúgio no mundo interior ou subordinarmo-nos ao exterior, adoptar um Mundo. Uno. Podemos, pelo menos, tentar. Simplesmente não sejamos demasiado idealistas ou optimistas, correndo o risco de nos iludirmos. Esse Mundo, uno, sempre terá portas comunicantes com os outros dois. Nesse mundo estaremos e o Outro, se o encontrarmos e os outros. Mas usando de códigos e através de pontes muitos distintas.



Idealmente a Babel não deveria existir. Cada um de nós não deveria nunca conhecer a angústia de perceber que o que é nem sempre coincide com o que É. Deveríamos poder ser, próprios, e ainda assim conhecermos os Outros completamente. Uma espécie de tradução simultânea em que cada um não transigisse ou comprometesse por um momento a sua língua para se fazer entender e, no entanto, todos se compreendessem. Mas olhemos à nossa volta. Tal parece ser impossível. E cada vez mais.



Por isso comecei por um pedido de Liberdade e afirmei que depois da viagem interior se pode regressar onde se estava e desistir de tentar ser Mundo Uno. Era, pelo menos, isso que queria dizer. Esclareço-o melhor agora.



Começo por aí pois a Liberdade de que venho escrevendo é uma questão prévia em relação à Linguagem do Mundo. É a questão prévia. Sem essa liberdade a unicidade do mundo de que falas seria falsa pois não seria uma construção mas uma inconsciência. Logo falsidade. E é contra isso que estou. Mas se o teu Mundo Uno, tal como o meu, for o resultado de uma construção, para mais feita após a viagem interior, penso que nos tornamos algo maior e melhor. Para nós mesmo e para o Outro e outros.



Sendo assim repito-o contigo: o par é mais viável. Pelos Deuses, como é mais viável!



E quanto ao outro longe magoar.... oh...don't get me started...







P.S. - no fim do percurso místico (e mesmo durante) há um indeterminado vazio. Mas não fui explícito e peço desculpa (a linguagem mística é por vezes oculta...ok, piadinha): o vazio pode chamar-se divindade. E este é o paradoxo mais simples e maravilhoso que pode haver.



Será tema para outro post mas quando se ama como eu (querendo significar uma totalidade) ou se subsitui a Vida pelo Amor, como uma alquimia impossível ou se buscam os deuses para preencher o imenso vazio (querendo significar o Absoluto). Aí está a explicação do paradoxo. Só a divindade é Amor Puro. Ou um Amor Puro em forma de Outro. O Outro é sempre um pouco de Cosmos.

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